Senadora eleita pelo PSB em 2010, na chapa que reelegeu o governador Jaques Wagner, Lídice da Mata frisa que não existe qualquer hipótese de rompimento entre ela e o atual ocupante do Palácio de Ondina.
Ainda que ressalte a relação política e de amizade, a senadora não usa meias palavras para se apresentar como candidata à sucessão de Wagner, ainda que não condicione essa candidatura à do correligionário Eduardo Campos a presidente. “Eu estou na disputa. Eu recebo apoio de diversos segmentos da base do governo”, assegura Lídice. Numa avaliação do atual cenário, no entanto, ela prefere ter cautela.
“Eu tenho conversado com os outros partidos aliados, mas como eu penso que 2013 não é o momento de se fechar todas as alianças, nem de se antecipar o jogo, nós estamos conversando, ouvindo os partidos”, sinaliza.
Tribuna – Senadora, acredita que os protestos recentes vão impactar na reeleição da presidente Dilma Rousseff em 2014?
Lídice da Mata – Já impactaram no Brasil inteiro, na avaliação de todos os governadores, do governo da presidente, especialmente dos governos de São Paulo e do Rio de Janeiro. Já tiveram um papel histórico cumprido. Se elas vão impactar mais ainda, eu acho que só se elas evoluírem, se houver uma volta às ruas, com agendas que se voltem contra o governo. Por enquanto, eu acho que elas já impactaram e que há tempo para uma recuperação do prestígio dos governadores e da presidente da República até a próxima eleição.
Tribuna – Com a queda na avaliação de Dilma e do governador Wagner, a senhora acredita que o PT na Bahia terá condições de impor candidato à base?
Lídice – Eu acho que imposição nunca é uma boa medida, mas eu não acho que o fato de haver esses desgastes queria dizer que o PT acabou. Não é isso. Nem eu coloco dessa forma. O PT é um grande partido, o maior partido de esquerda no nosso país, tem vinculação com movimentos populares, vinculações fortes com movimentos religiosos, com movimentos de trabalhadores rurais, urbanos. O que eu diria é que o PT, enquanto partido, pagou o preço de ter um certo desgaste, não apenas pelo fato de a presidente da República ser do PT e, portanto, haver esse desgaste. Houve um desgaste objetivo do PT em função de estar na Presidência da República, do que foi o PT antes, das suas promessas, da sua radicalidade, da sua apresentação como um partido da “ética pela ética”, do moralismo pelo moralismo, de um partido que tinha uma posição sectária frente às alianças e que foi obrigado a fazer concessões, obrigado a fazer alianças, alianças que eu diria heterodoxas, porque não ficou apenas num campo democrático, foi mais adiante, que eu compreendo todas, mas eu sou oriunda de partidos e de movimentos que sempre defenderam frentes políticas. Nós defendemos a frente ampla, com segmentos da chamada burguesia nacional, no tempo da ditadura militar. No período em que o PT surgiu, eu sempre estive defendendo posições democráticas para fazer avançar a nossa luta e depois aprofundá-las. O PT não, o PT cresceu na negação das alianças e é por isso que ele é cobrado agora. Há uma diferença. Há uma crítica ao PT, porque é uma crítica ao conjunto da esquerda, o PT como principal partido e é o principal partido porque se sustentou num discurso que era também de direita. Era até bem um discurso de direita. Um discurso meio Carlos Lacerda à esquerda, aquele discurso do combate à corrupção pela corrupção. Esse foi o PT que eu conheci. Nos primórdios do PT. Eu diria que o PT está bebendo um pouco do seu próprio veneno.
Tribuna – Como a senhora vê a afirmação do governador de que o PT tem legitimidade para encabeçar o processo de sucessão dele? Não há espaço para os outros partidos?
Lídice – Veja bem, são duas coisas diferentes. O governador, o que ele disse, é absolutamente correto. O PT tem legitimidade sim. Por que não teria? É o maior partido dentro da frente, é o partido do governador, é o partido da presidente da República. O que eu digo é que isso não basta. E ele não negou que houvesse legitimidade dos outros também. Ele fala da legitimidade, da minha, da de Marcelo (Nilo), da de Otto (Alencar). Da de todos aqueles que compõem a frente. O governador Jaques Wagner é um democrata. É um democrata com um partido. Sofre a pressão do seu partido, mas ele é um democrata. É um democrata e é o líder desse processo político. Nós temos confiança na sua liderança e achamos que a imprensa gosta de explorar a palavra lá, que o cara falou, que o tom foi diferente. Não existe isso. Aliás, chegaram a colocar no jornal agora que o governador estava quase se confrontando comigo. Não há nenhum confronto entre mim e Wagner.
Tribuna – Há risco de rompimento?
Lídice - Quem tiver apostando que eu e Wagner vamos brigar, perdem tempo. Além do nosso respeito político, além do exercício da liderança do governador no estado, de eu respeitar profundamente a sua liderança, eu sou amiga pessoal de Wagner. Eu tenho confiança pessoal nele, assim como tenho convicção que ele tem em mim. Então, eu não serei uma candidata contra o governo Wagner, porque se eu fosse uma candidata contra o governo Wagner, eu seria uma candidata incoerente, contra mim mesma. Porque eu apostei nesse projeto, o PSB apoiou Wagner antes do PT apoiar. Antes do PT apoiar a candidatura de Wagner, eu fui a Brasília pedir uma conversa com o ministro Jaques Wagner e disse: “nós vamos apoiar você. Nós tínhamos discutido na executiva do PSB e chegamos à conclusão que você é o melhor candidato. Nós estamos dispostos a lhe apoiar”. O governador deve lembrar disso. Oferecemos que nós começássemos a trabalhar com o Instituto Pensar, com instituições próximas a nossa militância, no sentido de começar a construir um programa de governo com ele. Então, nós apoiamos Wagner antes do PT. Não há nenhuma possibilidade de rompimento ou de estranhamentos entre mim e Wagner. Acabamos de ter uma ótima conversa. Tudo que eu fizer será conversado com o governador e acordado com o governador. Pode ser que o governador tome decisões que eu não concorde, como eu posso ter que tomar decisões que não sejam as que ele considerar melhor. Mas isso não quer dizer que nós tenhamos qualquer rompimento nem no plano pessoal nem no plano político ideológico.
Tribuna – A senhora está na disputa ou a candidatura da senhora depende da entrada de Eduardo Campos no cenário nacional?
Lídice – Eu estou na disputa. Eu recebo apoio de diversos segmentos da base do governo. Não são segmentos formais, são pessoas, são eleitores que me procuram diariamente para dizer que apoiam a minha candidatura. Eu vou continuar lutando para ser candidata do governo, para ser candidatada da base. Só que eu acho que nós temos ainda um longo caminho em 2013. Eu estou trabalhando no Senado, aprovei projetos importantes no Senado este ano, aprovei uma lei de facilitação da implantação das Zonas de Processamento de Exportação no Brasil, as ZPEs, que é uma lei importantíssima. Nós precisamos. Em 2013, desde o início, desde o final do ano passado, que o PSB repete isso como um mantra: “2013 será um ano difícil para a economia, nós temos que concentrar na gestão, na administração. Em 2014 nós trataremos de 2014 e da eleição”. Eu estou muito preocupada em ajudar os prefeitos do PSB a governar. Temos feito seminários de formação, temos colocado assessorias à disposição dos prefeitos, indo até os municípios, fazendo planejamento estratégico, debatendo a realidade do município, identificando linhas de financiamento no governo federal para que os municípios possam sair dessa dificuldade, lutando em Brasília com a tese que há muito nós estamos debatendo que é a reforma urbana já. E as ruas consolidaram esse posicionamento nosso, demonstrou que o PSB está com sua sensibilidade apurada, antenada com as necessidades do povo. Discutindo a necessidade de inversão do pacto federativo. Não é possível continuar com a concentração das receitas do país na União. É preciso repensar outro modelo de Brasil. É preciso reformular as nossas políticas.
Tribuna – O PT está no poder há 10 anos e não demonstrou capacidade de provocar essa mudança. A senhora acredita que Eduardo Campos vai conseguir fazer essa modificação que a senhora prega?
Lídice – Eu diria que o PT não demonstrou possibilidade de mudar. O PT foi um aliado de projeto. O projeto do SUS foi implantado depois da constituinte e se desenvolveu a partir do governo de Fernando Henrique para cá, e o governo Lula foi um aliado e investiu com muito vigor e o governo Dilma também, no processo de ampliação do SUS. Eu diria que cada governo respondeu a uma etapa, uma necessidade do povo brasileiro. Agora nós temos a necessidade de intensificar a nossa capacidade de gestão e de velocidade na aplicação das políticas públicas e dos investimentos necessários para o Brasil. É claro que o governo Dilma está fazendo um esforço enorme para viabilizar isso. Mas não está sendo fácil. Eu acho que a experiência de Eduardo como gestor de um estado nordestino, de um estado difícil, que passa as dificuldades da seca e que tem uma gestão muito bem aprovada, pode fazer sim com que ele se torne um candidato que empolgue o Brasil pela sua capacidade de dar resolução a problemas.
Tribuna – Prevendo o eventual lançamento de sua candidatura ao governo, já iniciou o entendimento com os outros partidos aliados?
Lídice – Eu tenho conversado com os outros partidos aliados, mas como eu penso que 2013 não é o momento de se fechar todas as alianças, nem de se antecipar o jogo, nós estamos conversando, ouvindo os partidos. As ruas demonstraram que é muito mais necessário para os políticos ouvir do que falar neste momento. O próprio governador Jaques Wagner está fazendo isso. Está fazendo uma bateria de conversas com movimentos sociais, mulheres, negros, enfim, está ouvindo a sociedade, como a presidente também.
Tribuna – A senhora, lançando a sua candidatura, vai conseguir atrair partidos da base para o seu projeto? Ou agregar partidos da oposição?
Lídice – Não necessariamente. Claro que eu espero que eu possa agregar. A minha candidatura não pode ser uma candidatura só da minha cabeça. Ela tem que apresentar um projeto maior do que o meu partido, senão eu seria candidata a continuar sendo presidente do PSB. E eu quero ser candidata ao governo do estado da Bahia. Ela tem que falar para a sociedade e receber apoio da sociedade, sem partido, apartidária, suprapartidária, para atrair segmentos de outros partidos, de outras legendas e, de preferência, que tenham apoio do governador. Que seja uma candidatura – eu quero ser candidata – com apoio do governador. Vou lutar por isso. Vou lutar para ser a candidata de Wagner ao governo.
Tribuna – Erros e acertos do governo Wagner? O que a senhora pontua de mais importante até agora?
Lídice – Eu não posso pontuar erros e acertos de um governo que não terminou. Balanço de governo se faz depois que o governo acaba. Nós estamos em pleno exercício de governo e, diferente de alguns do PT que querem diminuir o tempo de governo do governador, antecipando o debate eleitoral, eu quero prolongar. Eu acho que o governador teve uma marca indiscutível para a política da Bahia que foi a redemocratização da Bahia. A democratização do espaço político, a instalação e a instauração de uma nova cultura política no nosso estado, uma cultura política democrática, de ouvir, de debater, de permitir o crescimento de todos.
Tribuna – O PT até agora não conseguiu avançar em aspectos importantes do estado. O que, na visão da senhora, faria diferente para otimizar e buscar uma maior eficiência na gestão da Bahia?
Lídice – Eu continuo achando que vocês insistem em tratar o governo como se o governo fosse do PT apenas. O governo não é apenas do PT. Eu participo desse governo desde o início. Dou meu palpite, minha opinião. Muitas vezes me ouvem, outras vezes não ouvem. Isso faz parte do processo. O governo é um governo do PCdoB, do PSB, do PP. Tem pastas importantes na mão do PSD. O vice-governador é do PSD. E tem a pasta da Infraestrutura, aliás, muito bem em todo o estado. Mais de 7 mil quilômetros de estradas recompostas ou construídas pelo governo Wagner. Tem a Saúde que está na mão do PT, tem Educação que está na mão do PT, mas o Trabalho está na mão do PCdoB, o Turismo está na mão do PSB. Eu posso pensar sobre coisas que faria diferente porque tenho outro jeito, porque sou mulher e, obviamente, sendo mulher, vou ter políticas focadas na inclusão desse segmento da população como mulher. Vou estar focada para a construção de creches. Essa é uma necessidade imediata da sociedade brasileira. Creches públicas, creches privadas. Hoje nós não temos nem pública e nem privada. O número de públicas que nós temos para um país de dimensões continentais como o nosso é infinitamente pequeno. Os municípios não podem sustentar as creches com os recursos que têm. Nós precisamos pensar em políticas de sustentação. O governo federal vem elaborando, implementando políticas, estimulando, indicando políticas estruturantes na área social, mas não dá sustentação para que essas políticas sejam financiadas. Nós não podemos continuar dando creches, construindo creches para o prefeito sustentar a creche. Dando o Samu para o prefeito manter o Samu. Construindo UPAs ou postos de Programa de Saúde da Família, de unidade de Saúda da Família, com os prefeitos dando sustentação a isso. Não há possibilidade dessas políticas se sustentarem com aquela parte menor do quinhão da receita produzida pelo país, que está nas mãos dos municípios.
Tribuna – A senhora acredita que a base do governo dividida, com duas candidaturas, facilitaria para a oposição na Bahia retomar o poder?
Lídice – Não. Nós temos eleição de dois turnos. Isso só é verdade nos pequenos municípios, onde não tem eleição de dois turnos. Nós temos eleições de dois turnos. Todos os partidos que integram a base estão legitimados para desejarem ter uma candidatura. E podem até ter projetos partidários que levem a isso. O que nós temos é que defender os princípios que tornaram possível esse governo ser eleito aqui na Bahia. As principais políticas estruturadas por esse governo na Bahia. As principais marcas de democratização do acesso do povo às políticas públicas que esse governo implementou. Essa é a nossa obrigação.
Tribuna – O governo ACM Neto ainda é tímido ou era esperado esse período de arrumação de casa? A população espera mais do governo ACM Neto, já que a senhora foi prefeita da cidade?
Lídice – Eu não votei em ACM Neto publicamente. Eu ajudei e trabalhei por Nelson Pelegrino. Fui uma das coordenadoras da campanha, junto com (Walter) Pinheiro, então a minha expectativa era sobre o governo de Nelson e não sobre o governo de Neto. Agora, é claro que eu reconheço que ele ganhou a eleição, e se ganhou é porque havia uma expectativa que houvesse uma mudança. Acho que a sua situação é muito delicada porque a cidade tem poucos recursos. Ele tem encontrado em nós, eu estou à disposição do prefeito, da prefeitura e da minha cidade para ajudar em Brasília. Todos os três senadores da Bahia, os deputados federais, nossa bancada tem trabalhado nessa direção. As emendas de bancada do fim do ano passado demonstram isso, nosso desejo de contribuir com Salvador, e, mais do que tudo isso, o governador, que é quem mais pode ajudar e está ajudando. O nível de investimento anunciado pelo governo federal e pelo governo do estado em Salvador, eu gostaria de ter tido a possibilidade de ter esse tipo de ajuda. Agora, não é fácil. A cidade estava muito desarrumada. A cidade precisa ser repensada, e aí é que mora o problema. Quando as pessoas discutem o processo eleitoral, são muitas promessas sem estar conectadas com os conflitos da cidade. Há uma questão em discussão na cidade, que é a ocupação do espaço público, de que forma ele vai ser ocupado. Isso não quer dizer que nós vamos impedir os empreendimentos privados, a iniciativa privada, o crescimento da indústria imobiliária. Não. Mas nós precisamos que isso ocorra com equilíbrio, com a necessidade de ter uma cidade para o povo viver.
Tribuna – Que dê contrapartidas para a própria população...
Lídice – E a contrapartida não pode ser a única contrapartida que vá gerar emprego e renda. Porque gera na construção civil empregos. Não é isso. Passa das construções dos prédios. Nós precisamos de uma cidade melhor para que a gente possa viver menos sufocado. Menos estressante. Salvador não tem passeios públicos. Os passeios públicos não existem e os privados não são fiscalizados nem estimulados a existirem. São estreitos. As ruas são pequenas, estreitas em qualquer lugar da cidade. É impressionante. E não tem passeio para as pessoas andarem. Nas velhas avenidas, onde era natural, seria natural, porque não tinha carro naquele tempo, mas nas novas avenidas pior ainda. É aí mesmo que não tem passeios largos, que não tem ruas largas, salvo alguns trechos muito pequenos. Na Pituba, por exemplo. São complicados. O prefeito não tem recursos para fazer mudanças mais profundas. Tenho visto que ele tem boas intenções, que tem apresentado projetos interessantes, agora a chuva também está castigando. Eu acho que se eu fosse governadora eu ia propor ao prefeito passar uns 15 dias no semiárido, visitando o interior do estado, debatendo os problemas com os prefeitos para ver se ele levava um pouco dessa chuva pro interior.
Colaboraram: Fernanda Chagas e Fernando Duarte
Fonte Tribuna da Bahia
0 comments: