por Clóvis Rossi do Folha de S. Paulo
Dois fatos dão a medida exata de como a segunda eleição em oito meses na Grécia foi a despedida do sonho e o triunfo do pragmatismo. Primeiro, a fala de Alexis Tsipras, líder do Syriza, a coligação de esquerda radical: "Abre-se diante de nós uma rota de trabalho duro e esforço.
Nada nem remotamente parecido à ilusão trazida pela vitória anterior da esquerda, em janeiro, quando se vendeu a tese de que seria possível romper a austeridade imposta à Grécia por credores.
O segundo fato: cientes de que não havia ilusão a escolher, uma parcela significativa dos gregos preferiu nem comparecer às urnas. A abstenção ficou perto da metade do eleitorado (43,5%), sete pontos acima dos 36,4% de janeiro.
Como explicar que o Syriza tenha vencido de novo, depois de fazer campanha contra a austeridade em janeiro, depois de ter promovido e vencido um plebiscito também contra a austeridade, para em seguida render-se a ela?
Como não havia partido que fosse ao mesmo tempo contra a austeridade e a favor da permanência da Grécia no euro, o eleitorado preferiu o partido que se rendeu à austeridade, mas, pelo menos, tem propostas para amenizar o custo social a ela inerente.
Por isso, a ala esquerdista do Syriza, que rompeu com o partido e criou uma nova agrupação, a Unidade
Popular, não conseguiu os 3% de votos, o mínimo necessário para entrar no Parlamento.
A ultra-esquerda queria fugir da austeridade e também do euro. Tsipras, o premiê reeleito, cedeu à austeridade no pressuposto correto de que abandonar a moeda única seria acrescentar uma dor maior à da austeridade.
Bem feitas as contas, as duas eleições deste ano apenas fizeram a Grécia perder oito meses sem sair do lugar.
O resultado deste domingo (20) repete com poucas variações os números de janeiro. A Grécia estava, no início do ano, sobre estreita vigilância dos credores. Meses depois, continua vigiada, a ponto de o jornal espanhol El País ironizar, neste domingo, que o verdadeiro governante grego será não o primeiro-ministro eleito mas o holandês Marteen Verwey, chefe da missão de 20 inspetores da União Europeia.
É ele quem diz o que o governo que acaba de ser eleito (na verdade reeleito) deve fazer. É sintomático que um compatriota de Verwey, Jeroen Dijsselbloem, presidente do Eurogrupo, tenha se animado a sugerir, via Twitter, que Tsipras forme rapidamente um novo governo para continuar o processo de reformas.
Tsipras, por mera coincidência, apressou-se a fazê-lo anunciando que repetirá a coligação com os Gregos Independentes". Ou seja, em setembro e janeiro, tudo igual na Grécia, menos a ilusão.
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