No
Contrato Social, clássico da
Filosofia Política, Rousseau delineia que o Legislativo é o mais sagrado dos
Três Poderes; o argumento do iluminista suíço é pontual, porquanto são as leis
que regem o Estado Democrático de Direito, ademais os Três Poderes devem ser
fiéis aos ditames da Constituição. Em Ética
a Nicômaco, Aristóteles salientara que o legislador deve inspirar o cidadão
a fazer o bem; também enfatizara que a boa constituição é aquela que está
harmonizada com os anseios do povo. No renomado Do Espírito das Leis, Montesquieu teorizou a divisão do poder em
três instâncias, cujo Legislativo tem como prerrogativa a nobre tarefa de
legislar, engendrar as leis. Notoriamente, no âmbito municipal, o edil apresenta
projetos de lei e fiscaliza as ações governamentais do Executivo. A essência
deste singelo parágrafo só reforça a tese o quão é importante o cargo de
vereador.
De
quatro em quatro anos, seres inspirados pelos deuses da simpatia emergem no
meio de nós, meros mortais. Estes seres emanam uma aura de compromisso supremo
à cousa pública. Vossas pegadas e digitais são espelhadas nas redes sociais:
semblantes ostentam risos artificiais e promessas vazias e generalistas. Ilustríssimo
Leitor, adivinhe de quem estou falando! Sim. Eles mesmos. Os candidatos a
vereador! Que por sinal são muitos ou quase incontáveis. Alguns, anteriormente
ao período eleitoral, não demonstram a mínima curiosidade sobre política; desprovidos de serviços
prestados à sociedade, têm a audácia ou o cinismo de prontificar-se ao pleito
eleitoral. Uma das mais significativas heranças dos gregos não pode ser
banalizada, porém aqui no Brasil, que ainda é uma “República Bananeira”, o
verdadeiro sentido da palavra política
foi corrompido de forma exacerbada, cujo título eleitoral é a única
prerrogativa exigida para ser candidato. Neófitos e aventureiros infestam o
âmbito político, fator que revela o baixo nível da carcomida democracia
brasileira.
Doravante,
analisaremos com certa meticulosidade as propostas dos candidatos à vereança. A priori, visualiza-se um conteúdo
genérico. Eis uma proposta que virou clichê: “vou lutar pela saúde e educação”;
se o eleitor fizer uma inquirição, quiçá não ouça uma resposta convincente.
Outro jargão: “chegando lá, vou fazer diferente”; se for eleito, repetirá ou
potencializará as mazelas da “velha política”. Esse bordão também é ótimo: “sou
o candidato do povo”. No desenrolar da campanha, o povo se transforma num fetiche
de diversos candidatos. Até fora do período eleitoral, virou “modinha” ser um
paladino do povo. Sinceramente, “povo” é uma oca abstração que massifica os
indivíduos, camuflando as suas verdadeiras necessidades. O projeto propositivo
desses candidatos despertaria até a inveja de um presidenciável. Certas
propostas são surreais e evadem do escopo de atuação do edil. É quase uma regra
geral empunhar o estandarte da saúde e educação, não obstante é mister mensurar
se as proposições são aplicáveis e condizentes ao papel do legislador
municipal. Para fim de conversa ou de parágrafo, é incumbência do vereador:
legislar e fiscalizar o Executivo.
As
conversas dos candidatos são “bonitas” e sugerem um desprendimento em relação
ao atraente salário de vereador, além de aparentarem um amor incomensurável à
causa pública. Todo esse discurso encontra-se no plano da superficialidade, um
simplório capricho falacioso constituído de recursos sofísticos. Essas figuras
lendárias clamam pela diminuição salarial, todavia, caso sejam eleitos, lá no âmago,
ficariam felicíssimos com o recrudescimento da remuneração mensal. Uma vez mais
recorro à Ética Aristotélica, que atribui um exemplo de inspiração ao
legislador, por conseguinte, os eleitores têm grande responsabilidade na escolha
de seus representantes na Câmara Municipal. O cidadão poderia ser criterioso ao
enveredar o voto para um candidato, mas é notório e compreensível que o ato de
votar não é um exercício essencialmente racional. Em si, o voto tem uma
miscelânea de convicções pessoais e componentes afetivos. Sejamos justos, o
voto passional não é uma exclusividade da democracia brasileira.
Incontestavelmente,
o eleitorado é imprescindível na correção de vícios recorrentes na história
republicana. O olhar atento do eleitor deveria ter uma constância ao longo do
mandato de seus representantes, embora uma parcela significativa da população
limite-se ao direito do voto. A eleição finda-se e os eleitos caem no
ostracismo da memória coletiva. Em pleno século XXI, o nefasto clientelismo
ainda é uma praga presente nas eleições, sobretudo em cidades pequenas. O
comércio de votos já deveria ter sido extirpado da nossa democracia; candidatos
mal-intencionados utilizam o subterfúgio supracitado para angariar votos, se
bem que os atores envolvidos nesta peça cômico-trágica negam com veemência o
famoso “toma lá dá cá”. Quantos vereadores e prefeitos foram eleitos com este
estratagema? Inúmeros! Enfim, quando analisamos o discurso e as propostas,
somos induzidos a concluir que os candidatos a vereador são os autênticos e
verdadeiros salvadores da pátria.
(Tosta Neto, 10/08/2020)
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