A priori,
não escrevi o singelo artigo em questão por ordem dos “malditos” Peaky Blinders. Este que vos escreve,
poderia narrar o enredo da renomada série da Netflix, porém o eu-lírico foi afetado emotivamente pela Família Shelby, por conseguinte, o rigor
argumentativo seria comprometido. Também não contarei a história da gangue de
Birmingham. O título do artigo está deveras claro e dispensa justificativas. O
fato é que a gangue liderada por Thomas Shelby (Cillian Murphy), a sagaz Polly
Gray (Helen McCrory) e o caótico Arthur Shelby (Paul Anderson), caiu no gosto
popular. Por sinal, alguns internautas que não assistiram a série, efetuam
postagens nas redes sociais com frases reflexivas do icônico Tommy. Façamos uma
menção honrosa à interpretação genial do ator Cillian Murphy que dera vida e
autenticidade ao líder dos Peaky Blinders.
O
contexto histórico da série tem como ponto de partida a cidade de Birmingham,
no ano de 1919. Neste período, a Inglaterra vivia intensamente os traumas
advindos da Primeira Guerra Mundial
(1914-1918). Apesar da vitória da Tríplice Entente, a economia inglesa ficara
debilitada, emergindo problemas sociais que potencializaram as chagas
psicológicas oriundas do campo de batalha. É perceptível o orgulho dos
personagens que lutaram na França nas fileiras do Exército Britânico. A série
espelha as ruas lamacentas de Birmingham, fator que aponta mazelas no meio urbano. Voltemos à condição deficitária da economia inglesa. A
fragilidade econômica viabilizara a ampliação do poder das gangues na
sociedade, haja vista o império dos Peaky Blinders em Birmingham. O vazio
deixado pelo Estado foi ocupado pelos oportunistas gângsteres.
Em
1917, na Rússia, houve a Revolução
Bolchevique, movimento revolucionário que derrubara o czarismo
protagonizado pelo longeva dinastia Romanov e implantara o primeiro estado
socialista da história. Doravante, ideais socialistas se espalharam pela
Europa, obviamente, ecoando na Inglaterra. Na série, o personagem Freddie
Thorne (Iddo Goldberg), líder do proletariado, adepto do socialismo, despertara
a preocupação das autoridades policiais, sobretudo do carrasco inspetor
Campbell (Sam Neill). Além disso, percebe-se a interferência britânica na
guerra civil russa entre o Exército Vermelho e o Exército Branco, este último,
representando os anseios dos monarquistas russos. Winston Churchill não quisera
envolver diretamente a Coroa Britânica no apoio ao Exército Branco, delegando
tal tarefa para Thomas Shelby.
Na
5ª temporada, Peaky Blinders apresenta
as consequências da Crise de 1929,
engendrando um grande prejuízo no patrimônio da Família Shelby. A Quebra da
Bolsa de Nova York gerou um “efeito dominó” e abalou os alicerces da
economia mundial. A Crise de 1929 é
considerada a maior da história do capitalismo, tendo como resultado a
descrença na democracia liberal. Para muitos europeus, o regime democrático
mostrou-se ineficiente no combate aos efeitos deletérios do colapso econômico
global. Este sentimento de descrença proporcionou um ambiente propício à
expansão do ideário nazifascista no continente europeu. Na temporada
supracitada, há uma ênfase significativa no político britânico Oswald Mosley
(Sam Clafin), um entusiasta contumaz de Benito Mussolini, que se colocou como
baluarte fascista na Inglaterra. Convenientemente, a série expõe o apoio ou simpatia
de alguns figurantes pelo “canto da sereia” de Mosley.
Peaky Blinders,
como já foi citado acima, inspirou-se na gangue homônima de Birmingham
das três primeiras décadas do século XX. Até hoje, os historiadores não têm uma
resposta consensual sobre o paradeiro dos genuínos Peaky Blinders, mas sabe-se,
diferentemente do roteiro serial, que a gangue de ciganos foi derrotada pela
coalizão formada por Billy Kimber (líder da gangue Birmingham Boys) e os Sabini
(máfia italiana). É oportuno ressaltar que a série delineia o preconceito com
ciganos, judeus e negros. Apesar da porção expressiva de ficção, Peaky Blinders está bem costurada ao
contexto histórico do mundo entreguerras, um dos períodos mais conturbados do
século XX, pois engloba conjunturas históricas cruciais, entre as quais, a
advento de Mussolini ao poder na Itália, a Crise de 1929, o triunfo do nazismo
na Alemanha e a Guerra Civil Espanhola. A soma disso tudo foi imprescindível na
eclosão da Segunda Guerra Mundial.
Quem assistir a série será envolvido por uma trama atraente e presenciará a
exposição sobre uma página importante da história contemporânea.
(Tosta Neto, 31/08/2020)
Excelente texto! Muito bem escrito e elucidativo. Parabéns pelo conhecimento e pelo compartilhamento! Abraços
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