No clássico da
Filosofia Política, Do Espírito das Leis,
Montesquieu teorizou e sacramentou a divisão do poder em três instâncias, cujos
poderes são harmônicos, equânimes e independentes entre si. Um poder fiscaliza
o outro para que não exista abuso de poder. Notadamente, o tripé apontado pelo
filósofo iluminista é imprescindível no Estado
Democrático de Direito. O espírito republicano se vivifica na separação dos
poderes e no respeito à coisa pública.
É válido delinear que a principal função do Poder Judiciário é julgar se as
leis estão sendo aplicadas de forma correta, não obstante, em tempos de redes
sociais, percebe-se um fenômeno recorrente na contemporaneidade.
No século XXI, a
explosão das redes sociais concedera visibilidade para qualquer reles mortal,
logo, o internauta é livre para expressar suas opiniões sobre as mais diversas
temáticas. No turbilhão caótico de postagens, uma espécie de Tribunal das Redes Sociais “corporifica”
uma aparente existência. Tal tribunal está a patrulhar determinadas opiniões
que contrariam o seu escopo ideológico. Majoritariamente, o Tribunal das Redes Sociais é regido pela
cartilha do politicamente correto,
portanto, as publicações devem seguir os seus ditames. Uma afirmação dissonante
e contundente é examinada pelos juízes das redes; caso o
conteúdo não esteja afinado ao diapasão do politicamente
correto, o autor é condenado à morte virtual. O Tribunal das Redes Sociais é inclemente e não concede o “direito de
defesa ao réu”, porquanto o julgamento é instantâneo e passional, inexistindo
uma análise imparcial e atenta aos “autos do processo”.
Prezado Leitor,
voltemos ao Estado Democrático de Direito,
um dos pilares do Ocidente. O Estado supracitado é legitimado pela constituição
e pelo contrato social, portanto,
nesta perspectiva, é condição sine qua
non, a proeminência da diversidade de pensamento, todavia, tal princípio
não ecoa plenamente no âmbito cibernético. Se o internauta violar uma mísera vírgula
da cartilha do politicamente correto,
suscitam-se uma devassa nas postagens pregressas e um fulminante cancelamento;
este rebelde é transformado em pária, cuja existência virtual é enveredada ao
ostracismo pelo Tribunal das Redes
Sociais. Deve-se exaltar a grandiosidade da internet e a consequente
revolução no acesso à informação, fatores que viabilizaram o debate de ideias.
O unilateralismo ideológico não é salutar para uma nação, muito menos para o seu
povo. Reafirmemos o quão a pluralidade de ideias é significativa no desenvolvimento
do próprio pensamento.
Sinceramente,
sejamos realistas: no geral, a humanidade está agrilhoada ao “mais do mesmo”.
Quando um indivíduo sai da linha é tratado com desconfiança, haja vista o
prisioneiro que se libertou no Mito da
Caverna de Platão. Todo sinal de autenticidade é tachado como loucura pelo status quo. O ser humano é um ser social,
por conseguinte, é persuadido a seguir o movimento de rebanho (a modinha do
momento). Exemplifiquemos: escutar o que a maioria escuta, vestir o que a
maioria veste, postar o que a maioria posta. Notoriamente, as redes sociais
explicitam postagens que seguem um determinado padrão: fotos editadas com
frases de efeito (se forem antigas, esbanjam a famosa #TBT), compartilhamento
de memes, etc. Embora, visualizamos inúmeras postagens que trazem um conteúdo
informativo e universal; é óbvio que qualquer aspecto da vida tem pontos
positivos e negativos, não seria diferente com as redes sociais.
Ademais,
reflitamos sobre o automarketing promovido no ciberespaço. É categórico o anseio do internauta em construir um
arquétipo artificialmente positivo, espelhando a imagem heroica de defensor dos
animais, das árvores e de todos os oprimidos do Sistema Solar. Em
contrapartida, se o internauta “profanar” o código de regras, será visto pelos
justiceiros virtuais (não são o Justiceiro da Marvel) como um vilão do naipe de
Thanos. As redes sociais são um ambiente profícuo ao narcisismo; é de bom
grado, colocar-se como herói e juiz supremo perante aqueles que postam “insanidades”
e antagonizam o paradigma do politicamente
correto. Outrora, o narcisismo era um contato íntimo entre o eu e o espelho, todavia, no século XXI, houve uma migração para a tela do
celular. Enfim, o mundo se transformou rapidamente com a popularização da
internet, permitindo-se testemunhar o advento de tendências sem precedentes,
entre as quais, o Tribunal das Redes
Sociais. Nobre Internauta, tenha cuidado com vossas postagens, senão, um
deslize trará para ti a fúria dos justiceiros virtuais.
(Tosta Neto, 28/02/2021)
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