quinta-feira, 23 de junho de 2022

O SÃO JOÃO E O NORDESTE: UM ELO TRANSCENDENTAL (TOSTA NETO)

O outono teima em prolongar-se. O inverno se aproxima, logo, o coração do nordestino começa a ficar mais aquecido diante da iminência do amado São João. No Nordeste, ao longo do ano, as pessoas aguardam ansiosamente o advento dos festejos juninos. Tal vínculo é tão profundo que é deveras difícil retratá-lo por intermédio das palavras. O São João não pode ser descrito, outrossim, é um fenômeno que deve ser tão somente sentido. A relação entre a celebração joanina e o nordestino suplanta o plano da imanência.

O São João é literalmente uma explosão de cores, haja vista, as simpáticas bandeirolas que enfeitam o arraial e os emblemáticos tecidos de chita que compõem as vestimentas. Não esqueçamos dos fogos que iluminam o negrume e colorem o dossel. Além das cores, a nossa festa mais querida é repleta de sabores. Deparamo-nos com um cardápio de diversas comidas típicas, suscitando nas entrelinhas, a louvação da fartura propiciada pela colheita do milho e do amendoim, cujo ritual remete aos rituais pagãos da Idade Média que foram absorvidos e ressignificados pela Igreja Católica.

Os festejos juninos são embalados por uma trilha sonora típica, a qual, formada por certas canções que são verdadeiros hinos para o nordestino. Quando a sanfona, a zabumba e o triângulo se encontram, suscita-se uma epifania musical que desperta alegria e nostalgia. Prezado Leitor, este que vos escreve, é obrigado a citar a lenda (quiçá o maior nome da música brasileira) Luiz Gonzaga. O inexorável Rei do Baião apresentou a região Nordeste para o Brasil, cujas composições revelam a cultura, a natureza e a resiliência deste povo tão importante na formação do nosso país.

Além das questões elencadas acima, os festejos juninos celebram Santo Antônio, São João e São Pedro, santos bastante populares na tradição católica. Apesar da inserção da Indústria Cultural nas festas supracitadas através da realização de grandes shows do chamado “sertanejo universitário”, a simbologia religiosa persiste no inconsciente coletivo; de forma indireta, o ato de acender a fogueira personifica um ritual de conexão à transcendência. Por conseguinte, afirmo com convicção que a força avassaladora da Indústria Cultural não conseguirá quebrar o elo transcendental entre o São João e o Nordeste. Não é possível compreender a nossa região sem recorrer aos festejos juninos.

Notadamente, o Brasil é conhecido também como o País do Carnaval; tal alcunha reverbera no Nordeste, em contrapartida, no nosso âmago, o que realmente nos afeta no âmbito espiritual é o São João. Não preciso citar exemplos que demonstram experiências carnavalescas que explicitam a exclusão social. Por sua vez, o São João é eminentemente popular e expõe a sua pujança no interior. Aproveitando o ensejo, cito aqui o clássico Festa do Interior, interpretado pela grandiosa Gal Costa; a letra desta canção enfatiza o São João como uma genuína festa do interior. Conforme o que foi abordado até aqui, o São João é um evento riquíssimo, e a sua grandiosidade confunde-se com o cotidiano e a história do povo nordestino. Viva São João! Viva...

(Tosta Neto, 23/06/2022)

 

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