quinta-feira, 18 de junho de 2020


Sara, filha única, teve uma educação familiar bastante rígida, porém seus pais não descuidaram da parte afetiva que deve imperar no ambiente do lar. A família de Sara frequenta uma Igreja Conservadora que tem fortes laços com a tradição judaica.
Na iminência de atingir 18 anos, no 3ºAno do Ensino Médio, Sara tinha uma rotina delimitada: estudos escolares, aulas de música, exegese bíblica e cultos religiosos. Metódica, cumpria primorosamente toda a agenda diária. Ademais, ela cativava a todos com seu jeito humilde e prestimoso.
A jovem Sara era noiva de Elias, namoro iniciado quando ela tinha 16 anos. As famílias dos noivos eram muito próximas e partilhavam os mesmos preceitos religiosos. Elias tinha 19 anos e era um exímio violinista, demonstrando todo o seu talento durante as cerimônias religiosas:
– Amor, você gostou da minha performance no culto de hoje?
– Gostei sim. Como sempre, você tocou muito bem – responde Sara.
– Amanhã, estudarei novas canções a partir de um livro que ganhei de presente.
– Presente?
– Sim. Presente do meu amigo de infância Isaías.
– Certa vez, lembro-me, que você falou sobre ele.
– Há tempos, ele mora em São Paulo. Veio passar o período de férias aqui no interior. Isaías é o meu melhor amigo!
– Amizades verdadeiras devem ser cultivadas e preservadas.
– Concordo plenamente contigo! Por sinal, já estou indo, pois passarei na casa dos pais de Isaías para vê-lo.
– Está bem.
– Te vejo amanhã no culto. Boa noite!
– Boa noite! – beijinhos.
Sara acordou disposta. Começou o dia com a leitura do Salmo 18. Cumpriu metodicamente a agenda diária. Vestiu-se de forma elegante e enveredou para o culto:
– Boa noite Amor.
– Boa noite.
– Apresento-te o amigo que te falei. Eu o convidei para o culto de hoje.
– Prazer Sara!
– Prazer Isaías.
– Elias fala muito bem de você.
– Com certeza! – exclama Elias.
– Ainda bem – Sara emite um riso tímido.
– Isaías, como você sabe, estamos noivos. A data do nosso casamento já está marcada.
– Parabéns Sara e Elias.
– Obrigada.
– Obrigado Caro Amigo.
A conversa avançou uns minutos. Num determinado momento, Sara sentiu um leve constrangimento e retirou-se. Rumou para o banheiro do templo religioso. Olhou-se no espelho. Sentia um forte calor. Lavou o rosto para amenizar o desconforto térmico. Ela parou a refletir. Intentava compreender o que havia acontecido. Afogada em conjecturas e na ausência de respostas, Sara foi buscar conforto espiritual na cerimônia religiosa.
Logo após o culto, Sara não falou com Elias e evadiu direto para casa. O semblante transbordava inquietação. Uma vez mais, foi dominada por uma série de reflexões, sucedida por uma sufocante insônia. A absorta garota ainda não conseguia processar o motivo de tal sensação.
No culto seguinte, houve mais um encontro entre os três jovens:
– Sara, o que aconteceu ontem? Você foi para casa e nem falou comigo – admoesta Elias.
– Eu estava indisposta.
– Sara, percebi o quanto Elis ficou preocupado.
– Pois é.
Intimamente, Sara não ficava confortável com a presença de Isaías. Uma sensação estranha acometia o seu âmago. Ela se sentia devorada pelo olhar discreto e profundo do amigo de seu noivo. Cada segundo tinha o fardo da eternidade. Na solidão do quarto, pensava: “o que está acontecendo comigo? Essa sensação é inédita para mim. Não consigo encontrar uma explicação lógica. Senhor, conceda-me sabedoria para atingir uma resposta...”
Uns dias se passaram. Aparentemente, Sara manifestava medo da tal resposta: “o fato é que Isaías não me causa indiferença. Quando ele está próximo, um nervosismo invade as minhas entranhas. Ó Deus de Israel, qual é a causa de tamanho nervosismo? Será que estou...? Não. Não. Eu não posso. Eu sou noiva. Eu sou noiva. A data do meu casamento já está marcada...”
– Olá Sara! Tudo bem?
– Tudo bem.
– Ultimamente, você vem se ausentando no culto.
– Surgiram uns imprevistos.
– Cadê o Elias? – indaga o curioso Isaías.
– Não pode vir.
– Saiba que eu adorei ter te conhecido. Você é uma mulher encantadora!
– Obrigada – com rubor na face, Sara responde meio desconcertada.
– Elias é um sortudo.
– Pois é.
– Há algo em você que me cativa. Não sei bem explicar.
– Com licença. Preciso ir. Tchau.
Sara não voltou ao culto e seguiu para casa. Entrou no quatro e ficou trancafiada. Submersa em pensamentos: “enquanto ele estiver aqui, diminuirei a minha frequência nos cultos. ‘Há algo em você que me cativa.’ O que ele quis dizer com esta frase? Infelizmente, há algo nele que também me cativa. Quando Isaías se aproxima, fico sem chão. Meu Deus! Será que estou apaixonada? Eu não posso. Se eu pudesse teria evitado tudo isso. Porém, foi espontâneo. Fui pega de surpresa. Ele provoca em mim um turbilhão de sensações. Senhor, Vós sois testemunha do quão a tua serva foi surpreendida. Os sentimentos não são planejados e nem seguem uma trilha lógica...”
Sara tentava aniquilar o que vinha sentindo. Ocupou ainda mais a mente, todavia, no final das contas, a imagem de Isaías sempre aparecia na memória. Ela trazia um peso na consciência por causa da condição de noiva, não obstante, tinha a convicção da naturalidade deste sentimento proibido: “eu não forcei nada. Surgiu de forma inesperada. Eu nunca senti algo tão forte e insano. É mais forte que eu! Senhor, proteja-me desta tempestade...”
Certo dia, na saída da escola, Sara foi surpreendida:
– Olá!
– Olá – responde Sara visivelmente assustada.
– “Se Maomé não vai à montanha, a montanha vai a Maomé.”
Subsequente ao “silêncio ensurdecedor”:
– Sara, não consigo parar de pensar em você. Desde o dia que te conheci, esta é a minha sina.
– Sem comentários.
Repentinamente, Isaías pegou na mão de Sara. Ela estava pálida e estática. Sem forças, a garota não esboçou reação; sentia-se acuada como uma presa diante dum terrível predador.
– Estou apaixonado por você. Antes de voltar para São Paulo, desejo te encontrar.
Sara ficou muda. Isaías estava mui ofegante. Ulterior a um tempinho, os jovens seguiram caminhos diametralmente opostos.
Numa determinada noite, Elias não compareceu ao culto. Isaías vislumbrou uma oportunidade:
– Sara, depois do culto, posso te acompanhar até a tua casa?
– Sim.
– Grato! Fico lisonjeado. Até mais.
– Até.
A cerimônia dominical foi finalizada:
– Sara, eu não paro de pensar em você.
– Infelizmente, comungo com essa sensação.
– Por que “infelizmente”?
– Você sabe muito bem o porquê.
– Sei sim.
– É melhor não falarmos sobre isso, pois é muito constrangedor.
– Concordo contigo.
A noite progrediu paulatinamente. O caminho até a casa de Sara estava “iluminado” pela escuridão. O coração da garota batia bem acelerado. Isaías apertou a sua mão e disparou um terno beijo no rosto. Sem delongas, os jovens se beijaram por longuíssimos segundos. Sara sentia o corpo elevar-se para um mundo desconhecido; uma atração física arrebatadora a dominou. Ela abraçou Isaías com todas as forças...
– Sara, na terça-feira, estarei voltando para São Paulo. Amanhã, eu desejaria me despedir de você.
– Não vá. Não me deixe.
– As minhas férias estão terminando. Necessito retornar ao trabalho.
– Tudo bem.
– Iremos nos encontrar?
– Claro!
– Horário e local?
– Às 19h30, no jardim da Praça Nelson Rodrigues.
– Combinado. Boa noite. Até amanhã!
– Até amanhã!
Na companhia do quarto, Sara comentava: “que sensação maravilhosa! Ainda não havia experimentado algo tão estonteante. Os beijos dele me levaram para outro plano. Pela primeira vez, um desejo sexual incontrolável apoderou-se do meu corpo. Amanhã será a nossa despedida. Aproveitarei intensamente cada segundo...”
– Boa noite Sara. O dia passou muito devagar.
– Com certeza!
– Eu vim no carro do meu pai. Estacionei numa rua escura logo ali.
– Certo Isaías. Irei te seguir à distância com toda discrição.
Uns minutos esvaíram:
– Iremos para um lugar discreto e aconchegante – informa Isaías.
– Tudo bem.
– Lá, ninguém irá nos incomodar.
– Perfeito.
Brevíssimo silêncio. Beijos suaves. Elevação da temperatura. Beijos mais intensos. Línguas entrecruzadas. Roupas atiradas ao chão. Sara esbanja insegurança. Isaías a tranquiliza. Os beijos regressam à suavidade. A inexperiente garota angaria um pouco de confiança. Cada movimento é calculado milimetricamente. O coração feminino saboreia uma sensação mista de medo e curiosidade. Um agudo e prazeroso grito de dor emana no espaço. O sangue escorre manchando o lençol branco...

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